Então, qual deve ser nosso método de defesa quando recebermos uma ofensa?
Qual é,
neste caso, a melhor forma de reagir?
Como se resolve o problema da vingança?
Quando alguém faz
uma coisa injusta contra nós, a grande maioria julga que temos de reagir, e que não é
sabedoria, mas loucura, deixar essa reação nas mãos da Lei, que sabe cumpri-la muito melhor.
Antes de tudo é necessário que renunciemos a vingança. Isto é lógico para
quem compreendeu que é muito mais fácil chegar a justiça por intermédio da Lei, que possui
poderes maiores do que os nossos. O mundo julga essa renúncia, que nos faz recuar perante o
ataque, como fraqueza e covardia. Isso pode ser verdade na lógica das leis que dirigem o plano
de vida animal e do homem que a ele pertence. Mas, para quem subiu a um plano mais alto,
essa renúncia significa afastar o empecilho ou lançar por terra a parede representada pela
nossa intervenção, que paralisaria o funcionamento da Lei com relação a nós.
Assim, a primeira coisa a fazer é renunciar a vingança.
Mas, enquanto quisermos fazer justiça, a Lei respeitará nossa livre escolha,
e não intervirá, para não sobrepor um juiz e executor de justiça ao outro. Mas acontece também
outro fato: quando tivermos renunciado, na realidade a vingança, e só neste caso, ela se
realizará automaticamente, sem nossa intervenção, por intermédio da Lei que, indiretamente para que a justiça seja feita, tem de cumprir também essa vingança que nela está implícita.
Disto se segue que poderíamos afirmar: só se pode chegar a mais completa vingança quando
tivermos destruído em nós todo o desejo dela, e; perdoando tudo, não tivermos feito nada para
realizá-la, pelo contrário, deixando tudo nas mãos de Deus, isto é, entregue a reação da Lei.
O primeiro passo, então, é renunciar a vingança. O segundo é perdoar a ofensa.
Mas, há
ainda mais. Embora renunciando a vingança e perdoando a ofensa, podemos ficar com sua
lembrança e com o rancor e ódio por ela gerados. Enquanto tivermos dentro de nós a idéia de
um direito nosso não satisfeito; ele pertencerá a nós, e a Lei não poderá transforma-lo em
direito seu; para tomar nosso lugar na defesa. Para que isto aconteça, é necessário esquecer o
problema de exigir justiça para nosso caso particular, porque só assim ele se pode tomar
problema pertencente à Lei, que é o da realização da justiça universal. Quando conosco
acontecerem essas coisas, podemos ficar sossegados, esperando a automática realização da
justiça, o que elimina a necessidade de uma vingança. Neste caso, a realização da justiça terá
a vantagem de não representar de nossa parte uma nova injustiça para corrigir a velha, como
se costuma fazer no mundo, e assim, ela não aumentará nossa dívida, mas será só execução
de justiça em nossa defesa, na qual o devedor terá de pagar, enquanto que, ao mesmo tempo,
nos deixa inocentes de tudo isto, livres de culpas novas, que depois por sua vez teríamos de
pagar.
A coisa mais importante é ficarmos isentos de qualquer dívida; o segredo de nossa vitória
não é o de possuirmos força, mas de estarmos limpos de qualquer mancha. Por isso, não
devemos ficar ligados ao ofensor, que representa a injustiça, nem sequer por um pensamento
de vingança.
Quem apenas perdoa, não reage e não exige compensação, mas admite a ofensa
e a dívida dos outros a seu respeito. Mas, para que se desloque completamente de nós para a
Lei a função da realização da justiça, é necessário não conservar na propriamente nem a
lembrança da ofensa nem a do ofensor. Não significa isso que a experiência não tenha de ser
aprendida, mas, sim, venha a completar-se no esquecimento definitivo, que é o único que
resolve, para que o caso não se repita, e não continue numa cadeia de novas injustiças sem
fim. É difícil sair dessa rede, uma vez que caímos nela.
A força de injustiças, nunca será
possível chegar à justiça, ao passo que, perdoando e esquecendo, se entregarmos tudo à Lei,
perante ela ficam de pé e terão de ser resolvidos, em perfeita justiça, o débito do ofensor e o
crédito do ofendido. Perdoar não quer dizer que o primeiro não tenha mais de pagar, e que o
segundo não tenha de receber. É erro acreditar que o perdão seja para nós contraproducente.
Ele representa vantagem, porque liberta quem perdoa de todas as más conseqüências, ao
mesmo tempo que não apaga o débito do ofensor, o qual não tem de prestar contas a um
homem (o ofendido), mas ao próprio Deus. Só assim se pode sair do plano da injustiça baseada
na força, que é o plano do mundo, e entrar no da justiça, que é o de Deus, o que para o homem
justo representa a melhor posição e vantagem.
Não há dúvida de que tudo isso tem sua lógica e beleza, mas é verdade também que
quase ninguém o pratica, julgando-o loucura.
A LEI DE DEUS
Autor: Pietro Ubaldi
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